“O conhecimento
pode criar problemas, mas não será a ignorância que irá
resolvê-los.”¹
Isaac Asimov
Desde que
a web trouxe a facilidade de acesso aos diversos formatos de arte eu
me vi inserido em um processo cuja discussão procurei apresentar em
meu blog. Não questiono legalidade, pois sei que está vinculada ao
poder. A história mostra que o direito é criado e alterado
consoante o movimento dos grupos que detém o poder. Apenas raras
vezes, excepcionalmente, favorece o povo, na maioria dos processos
obedece aos interesses desses grupos dominantes. Contudo, utilizar-me
desse argumento para defender a ideia de compartilhamento, em
oposição a propriedade, é fácil demais, até errado. Sei que
muita gente que faz downloads de obras e são a favor do
compartilhamento, no momento de um debate mais aprofundado, não
dispõe de fundamentos para defender seu pensamento, caindo na
armadilha de se utilizar de retóricas sem qualquer embasamento (os
editores são ricos, o autor não ganha nada, fazer downloads não
causa prejuízo e etc...). Nunca foi esse meu intuito. Nesse
imbróglio, um turbilhão de paixões, ideias e propostas surgem, é
na argumentação que eu pretendo estar colaborando.
A
sociedade está em constantes transformações, o modus operandi do
final do século XIX mudou muito. No artigo que escrevi
sobre duas das maiores editoras do mundo² pode-se observar como
funciona esse processo, a criação de leis e suas posteriores
alterações. Desde o início a legislação sobre o direito autoral
teve o intuito de proteger os possuidores dos direitos autorais, não os autores. No princípio, os detentores do
direito autoral eram determinados pelos nobres, que além de
escolherem quais as obras a serem publicadas (na época copiadas
manualmente) também censuravam e alteravam os escritos. Esse inicio
corrompido, mais outros desvios éticos, econômicos e morais ao
longo da história, foram os alicerces das grandes editoras,
gravadoras, distribuidoras e empresas cinematográficas, inclusive em
detrimento do direito do autor. Para corrigir os abusos do passado
somente inventando uma máquina do tempo, algo impensável nos dias
atuais. Portanto não adianta discutir sobre como ocorreu a formação
do poder, apenas compreender, pois com esse conhecimento podemos
impedir que se repitam esses abusos e construir algo melhor para o
futuro.
Sabendo
que eles próprios, editoras, gravadoras e empresas de cinema
violaram, diversas vezes, o copyright, exploraram autores e que hoje
afirmam que não é justo ou correto fazê-lo, entendo que não é
por questões legais nem pseudo-morais que os caminhos serão
escolhidos. Estamos em uma época que novos meios tecnológicos surgiram, estão
revolucionando o mundo. O desenvolvimento dos meios de produção
impele a sociedade para novas relações, independente da vontade de
qualquer grupo que a compõe, assim foi com a prensa de Guttemberg,
com o fonógrafo, o cinematógrafo, as fitas cassetes, o
vídeo-cassete, cd e dvd, e, finalmente, a mídia digital virtual. As
primeiras empresas de cinema, Fox e Warner Brothers entre elas,
violaram o copyright do inventor do cinematoscópio, Thomas Edison,
para criar filmes e ganhar dinheiro nesse processo³, e isso ocorreu em
todas as áreas. Atualmente com as mídias digitais, acontece a mesma
coisa, apenas não são grupos empresariais, mas pessoas comuns,
usuários do computador que estão fazendo o mesmo. Na minha opinião, as empresas que
se virem para resolver seus problemas de adaptação às novas
tecnologias, elas não se preocuparam antes com o autor, nem depois com
os trabalhadores que ficaram desempregados com a implementação de tecnologias, então isso não me preocupa.
Entro,
então, no que considero o cerne da questão, o autor. Existe, para
mim, uma linha de pensamento que gosto de adotar, primeiro imagino um
mundo ideal e depois o relaciono com a realidade como vivemos hoje.
Porque penso assim? Creio que devemos imaginar um mundo ideal e
tentar apresentar soluções para o mundo de hoje que nos leve em
direção a esse mundo ideal. Acredito que em um mundo ideal ninguém
vai precisar de dinheiro, mas a arte vai continuar a existir. Qual o
motivo para ser criar alguma coisa se não vai haver o lucro? A
remuneração não é o que move o ser humano no processo de
criação, o motivo é outro, a satisfação pessoal, a realização, o prazer.
Com esse mundo ideal em mente, volto a analisar a sociedade nos dias
de hoje. Estamos em um período de transição, portanto é
necessário a remuneração para que os criadores das obras possam
continuar a criar. Essa remuneração não está vinculada ao
processo de criação, mas é ela que dará condições ao autor para
criar. Neste caso estou desvinculando a obra de sua remuneração,
pois aquela é independente e pode gerar uma receita de diversas
formas. Encontramos, enfim, o grande problema: Como o autor deve ser
remunerado, se considerarmos a liberação de downloads?
Minhas
sugestões são resultados de várias pesquisas, são possibilidades,
requerem muitas adaptações, mas buscam conciliar, no momento, as
diversas variáveis, autor, meio tecnológico, usuário da internet,
entre outros, com a finalidade de se aproximar, no futuro, do mundo
ideal.
A afirmação de que o download causa prejuízo, parece que,
realmente, é um mito. Um trabalho recente (maio de 2012), um artigo
acadêmico4, de R G Hammon, economista e pesquisador da
North Carolina State University, o qual comprova que os downloads de
álbuns ainda não lançados ajudam nas vendas dos mesmos, contraria
todos os atos, discursos e interesses das indústrias da música.
Antes disso, porém, um renomado escritor, Paulo Coelho5,
já afirmara que pirateava seus próprios livros, divulgando-os
gratuitamente na internet, como forma de incentivar suas vendas. Essa
já é uma grande pista, da forma de auferir e aumentar receitas, que
pode ser utilizada por outros autores. Além da distribuição livre,
com intuito de propaganda, os processos de distribuição e venda
também podem ser feitos pela web, o que livra o autor da exploração
dos grandes monopólios. Aliada nesse processo, é a criação
digital, que facilita para os autores o próprio processo de criação,
baixando o custo e reduzindo o tempo para desenvolver uma nova obra.
Novos métodos de ganho surgem a todo momento na internet, postagem
de vídeos no Youtube, garantem rendimento de acordo com o número de
acessos, autores postam capítulos, um a um, em sites cobrando não
pela obra, mas pelo acesso ao site, outros podem utilizar-se da
quantidade de acessos para também usufruir das propagandas que vão
lhe gerar outros rendimentos. Os blogs, sites que podem servir como
portfólio, para diversas áreas de criação, divulgam, ainda mais,
os autores e suas obras.
Esses são
alguns caminhos, sugestões que incluem o que já existia e o que está surgindo,
mas a proteção ao autor é algo que deve permanecer, constar em leis, até que
esse processo tenha se aprofundado, o autor deve ser protegido,
principalmente, do uso indevido, com fim de lucro, de suas obras. Se
um autor de uma obra coloca fotos ou criação gráfica, de outro
autor, e vende essa obra, então está obtendo lucro direto com a
obra de outro, se porventura, coloca fotos ou arte gráfica de outro
autor em site, e ganha em acessos por esse fato, isso é lucro
indireto com obra de outro autor. Em ambos os casos deve haver
legislação que proteja o autor desse uso indevido. Desta forma,
estarão garantidos o criador, que poderá continuar a produzir suas
obras e o acesso livre e democrático da web, salientando que
compartilhar não inclui lucrar com uso indevido de obras, mantem-se
a integridade do processo. Algumas distorções ficarão mais
explícitas, como a manipulação de leis para aumentar o período do
direito autoral pelas empresas, tomar posse de direitos autorais de
outros autores, além de relações mercadológicas viciadas, como
das editoras no sistema educacional brasileiro, a edição de HQ's
estrangeiras no Brasil, preços abusivos de livros (lembrando a
imunidade tributária do papel, ou seja, não incide imposto algum!).
É óbvio
que a visão é simplista e a sociedade é complexa, mas as opções
para os autores existem, para a socialização das obras com o
compartilhamento também, e somente as mega-empresas monopolistas
ainda não viram que podem ganhar com esse processo, preferindo não
só ficar à margem como tentar transformar em marginais os que estão
na vanguarda.
Obs.: Gostaria de agradecer a Thais Linhares por seu comentário, pois este me despertou a ideia de escrever esse artigo.
1. Asimov's
guide to science - página 15, Isaac Asimov - Basic Books, 1972 - 945
páginas
3. http://www.filmsite.org/pre20sintro3.html e http://www.punkerslut.com/articles/hollywood_the_worlds_greatest_pirates.html